domingo, 22 de junho de 2014

Dupla personalidade

Fico lutando com meu próprio ser na tentativa de sentir e decidir, se a minha metade de amor é maior que a de ódio ou vice-versa, ao que diz respeito a esse homem. Ele desencadeia esse misto em mim com a sua dupla personalidade. Ele fica entre me acolher e me ferir.

Deito na minha cama, fingindo estar dormindo - uma tática que desenvolvi ainda pequena para fugir do tormento quando ele se deixa levar pela personalidade maléfica - e fico reprisando os bons e os maus momentos - involuntariamente até - contabilizando qual está em vantagem. Chorando baixinho, pra não correr o risco de ser mais atormentada ainda pelo homem que possui todo o ódio que eu jamais senti por alguém. Nesse momento, me vem à mente o cara que fazia com que minha mãe saísse pela madrugada comigo atrás de um hotel; a pessoa que atropelou um motociclista por ser imprudente; toda a vergonha que a família passava diante das besteiras ditas por aquele que no outro dia sequer lembraria do que tinha feito e dito; dos pratos quebrados sem razão nenhuma; das brigas que eu era testemunha; lembro da certeza e da raiva da frase dirigida à mim "eu amo mais a cerveja do que você". É nesse momento também, que eu recordo daquele moço gentil que me ensinou a jogar vôlei; que segurou a bicicleta sem rodinhas para que eu aprendesse a me equilibrar; lembro do olhar de preocupação e fúria do homem protetor que saiu correndo na rua atrás de um sujeito que me assediou aos 9 anos; sinto o calor dos braços que me envolviam para assistir pica-pau, enquanto eu tomava um copo de nescau; recordo da personalidade boa que fazia cócegas no meu pé até eu dormir; a calma que ele transmitia quando eu estava apavorada com medo da Samara; a surpresa que era dormir no sofá e acordar na cama; ouço a voz da experiência que me ajudou a escolher o curso na faculdade. É nessa hora que eu percebo que além do maior ódio, eu sinto o maior amor do mundo por esse homem. Isso que me faz não desistir, não parar de falar, não parar de ver.

Quero desesperadamente abandonar por completo o pensamento "como eu queria que o pai da minha amiga fosse o meu pai". Eu preciso que ele seja invadido pelas coisas boas que ele tem, que ele seja somente a alma que ele nasceu com, ao invés de intercalar com as perdições que ele encontrou pelo caminho. Porque pesa, porque me dói por inteiro esse ódio que sinto por quem eu amo. Quero me livrar dessa mágoa que me impede de ser toda amor, que me atrasa e me faz ficar presa ao passado. E ele também precisa se livrar da doença, da parte podre que faz com que ele destrua tudo que está ao redor dele, e principalmente que o destrói. Só que é realmente cansativo querer ajudar alguém que não ajuda a si próprio.

Foram doze anos desejando com o coração mutilado, que ele fosse mais forte que a droga, que ele me amasse fortemente para me preferir feliz, pedindo que ele tivesse vontade de viver. E quando eu já estava desacreditada ele me diz pela primeira vez sem os olhos vermelhos "eu vou me tratar, eu quero viver, me perdoa". Por 10 minutos, senti toda a paz existente me invadindo, me senti mais leve, um tipo de alegria que nunca na vida senti igual, porém logo a razão me fez tocar os pés no chão e entender que a batalha era longa e nada simples. Lembrei também das milhares de vezes que ele disse essas mesmas palavras, no entanto, de olhos vermelhos e cara inchada. 

Hoje só peço e rezo para que seja verdade, para que realmente aconteça. Pois nós dois sabemos o quanto é necessário eu trocar a vergonha e a mágoa pela gratidão e o orgulho. E ainda mais necessário que ele esteja vivo.

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